Morrer da Cura         Â
Em 7 de junho de 1954, Alan Turing – considerado o pai dos computadores, matemático, criptólogo que decifrou as mensagens da máquina Enigma que mandava as ordens de Hitler para seus comandados – mordeu uma maçã mergulhada em cianureto de potássio no seu quarto, em Wilmslow, Cheshire, Inglaterra.
Por ironia, ao dar queixa à polÃcia de roubo praticado por um namorado, passou de vÃtima a réu. Condenado por prática de homossexualidade, teve o “benefÃcio†de optar entre o encarceramento e se submeter a tratamento hormonal – uma espécie de castração quÃmica.
Turing optou pela segunda hipótese mas, não resistiu à depressão causada pelos efeitos dos estrogênios, hormônios femininos inoculados em seu organismo. Apenas em 1969, o Reino Unido descriminalizou a opção sexual de quem “pensava diferenteâ€.Â
Infância
O diplomata britânico, servindo na Ãndia, Julius Mathison Turing e sua esposa grávida Ethel Sarah desejavam que seu filho ou filha tivesse nacionalidade inglesa e deixaram Chatrapur em direção a Paddington, onde Alan nasceu, em 23 de junho de 1912.
Deixaram o bebê e seu irmão mais velho com amigos ingleses até a idade escolar, pois “eram muito solicitados para viagens”.
No perÃodo de seis anos, compreendido entre o aparente abandono explicado como o “desejo de não colocar em perigo a saúde das crianças, que estariam em constante contato com as moléstias existentes na colônia inglesa†e a matrÃcula no Colégio St. Michael, o menino aprendeu a ler sozinho em 3 semanas e mostrou grande interesse por números e quebra-cabeças.
A genialidade, logo percebida por todos os professores, fez com que fosse matriculado em Sherbone (em Dorset), aos 14 anos.
O primeiro dia de aula coincidiu com uma greve geral no paÃs. Turing estava tão ansioso que correu os mais de 30 km que separavam Southampton da nova escola, em tempo recorde. A façanha foi noticiada na imprensa local.
Tomou gosto pelo desafio do esporte e tornou-se maratonista. Em 1949, concluiu a prova em 2 horas, 46 minutos e 3 segundos, disputando classificação para os Jogos OlÃmpicos.
Uma perna quebrada encerrou a carreira e os pódios.
Superdotado
Mas o grande interesse era mesmo direcionado à matemática e Turing não se adaptava bem aos cursos normais de Sherbone.
Assim, aos 16 anos, teve contato com os trabalhos de Einstein.
Captou a essência, compreendeu a mensagem e apoiou as crÃticas de Einstein à s leis de Newton.
Este perÃodo foi acompanhado e, sobretudo, apoiado por Christopher Morcom, um jovem igualmente genial e primeiro namorado, que morreu em uma epidemia de brucelose.
Abalaram-se as ambições e afetou-se para sempre a sensibilidade amorosa de Alan Turing.
Para honrar a memória de Morcom, dedicou-se ainda mais aos estudos. Foi aceito no King’s College, Universidade de Cambridge e foi discÃpulo de Harold Hardy, matemático famoso.
 Em 1935, aos 23 anos Turing foi nomeado professor do King’s College, já reconhecido como brilhante pensador.
Primeiros estudos sobre computação
Em 1938, depois de passar dois anos na Universidade de Princeton, orientado por  Alonzo Church, obteve seu Doutorado.
A tese era sobre o conceito de hipercomputação.
Alan imaginou uma máquina capaz de fazer qualquer tipo de cálculo, desde que lhe fossem dadas as instruções necessárias. Não se falava em chips ou processadores, apenas fórmulas matemáticas, mas, ali estava a descrição do que conhecemos hoje como computador.
No estudo “Os números computáveis aplicados ao  “Entscheidungsproblem” (publicado em 1936), foi reformulada a linguagem  formal universal para o que se conhece como “Máquina de Turingâ€: resolve qualquer problema matemático que se possa representar por um algoritmo. Continua sendo uma importante ferramenta para estudos de Matemática Pura.
O Pai do moderno computador é considerado, também, o fundador da ciência da computação e o primeiro a desenvolver o conceito de inteligência artificial.
Decifrando o Enigma
Durante a segunda guerra mundial, Alan Turing foi um dos principais pesquisadores em Bletchey Park – centro secreto do serviço de inteligência britânico.
Ali,  realizou trabalho fundamental de criptografia, que ajudou a mudar os rumos da segunda guerra mundial: quebrou o código de comunicações entre o alto comando de Hitler.
 A máquina,  chamada Enigma, usava um sistema de engrenagens que misturava as letras – como cartas de um baralho – antes de serem transmitidas pelos telégrafos.
Turing imaginou o Colossus – que um biógrafo chamou de “tataravô do PC – e chegou a decodificar cerca de 50 mil mensagens por mês.
Enquanto homossexuais usavam triângulo rosa nos campos de concentração, um matemático homossexual literalmente zombava de Hitler, ajudando a abater submarinos e aviões germânicos e inventava um teste – Teste de Turing – para decidir se máquinas pensam ou não. Em 1942, foi aos Estados Unidos decodificar os códigos japoneses e conheceu  Claude Shannon de quem se tornou muito Ãntimo.
A quebra do código do Enigma foi mantida em segredo até os anos 70. Nem amigos mais próximos e nem a famÃlia jamais tiveram idéia do que se passou.
Tempos finais
Em 1952, um garoto de programa encontrado ao acaso e acompanhado de um cúmplice assalta a casa do gênio.
Durante a queixa, dada na delegacia próxima, o policial pergunta como conheceu o acusado. Acontece que, naqueles tempos, assumir a orientação sexual significava receber acusação de “manifesta indecência e perversão “, segundo as leis britânicas sobre sodomia.
A mÃdia internacional acompanhou cada segundo do julgamento e informou a sentença: ou dois anos de encarceramento ou um ano de tratamento de “redução da libidoâ€, à base de hormônios femininos.
Cresceram os seios e muitos outros efeitos secundários da overdose de estrogênios, mas Turing optou pela possibilidade de, livre, continuar trabalhando.
Consagrado em 1951 como membro da  Royal Society, a partir do episódio de 1952 foi eliminado dos grandes projetos cientÃficos.
Na manhã de 8 de junho de 1954, a faxineira encontrou o corpo de Turing.
Na véspera, revelou a necropsia, ele havia se deitado e mordido uma maçã mergulhada numa jarra com cianureto de potássio.
Era admirador fanático do filme de Walt Disney “Branca de neve e os sete anões” os 7 anões†que viu pela primeira vez em 1938, em Cambridge, e reviu dezenas de vezes.
Durante o tratamento hormonal cantava compulsivamente um trecho da trilha da pelÃcula que dizia no original “mergulha a maçã na jarrinha e deixa a morte, que nos adormece, entrarâ€.
O homem que morreu desonrado e rejeitado também revive, para sempre, na  bela biografia escrita  pelo matemático Andrew Hodges.
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Abaixo o link completo do filme dublado em português
 Enigma – O jogo da imitação